As mentiras que se contam contra as vacinas para COVID-19

Artigo
12 jan 2022
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A Anvisa aprovou, em 16/12/2021, a vacina pediátrica da Pfizer/BioNTech (Comirnaty®) para crianças na faixa etária de 5-11 anos. Ao noticiar a liberação, previ que seríamos bombardeados por uma onda criminosa de fake news e desinformação contra os imunizantes.

A dose pediátrica foi desenvolvida especialmente para crianças e contém o mesmo princípio ativo da vacina Pfizer para adultos, mas é 2/3 menor que a usada por pessoas com 12 anos ou mais. A dose pediátrica é de 10 microgramas (concentração de mRNA é 0,1 mg/mL), enquanto a dose normal é de 30 microgramas (concentração de mRNA é 0,5 mg/mL).

 

Experimental?

Nenhuma criança está sendo usada como cobaia. A vacina da Pfizer/BioNTech não é experimental, pois já passou em todas as fases de estudos pré-clínicos (em animais), clínicos (em humanos) de fase 1 (segurança, imunogenicidade), 2 (segurança, eficácia, imunogenicidade e definição de dose em grupo pequeno) e 3 (segurança e eficácia em estudo randomizado, duplo cego e controlado com grupo placebo). A eficácia e a segurança foram demonstradas no estudo padrão ouro de fase 3 e a segurança continua sendo monitorada na fase de farmacovigilância (fase 4), após liberação de uso e aplicação em milhões de crianças de vários países.

Nenhuma etapa no desenvolvimento da vacina foi pulada, mas etapas foram aceleradas em virtude da grave crise sanitária. A vacina pediátrica foi aprovada por todos os principais órgãos reguladores internacionais, também pela Anvisa e com opinião favorável das sociedades médicas brasileiras, além de todas as sociedades de especialidades médicas envolvidas em outros países, da agência americana FDA e da europeia EMA.

A autorização da Anvisa para inclusão no Plano Nacional de Imunizações é uma garantia de que o imunizante é eficaz e seguro. Esses são os profissionais qualificados para avaliar se uma vacina é segura, eficaz e necessária, não os negacionistas de plantão ou os palpiteiros das redes sociais. Mais informações, aqui, aqui e aqui .

A imunização de crianças no país deve ter início na sexta-feira, 15 de janeiro, com 29 dias de atraso desde que a Anvisa aprovou a vacina.

Infelizmente, nós vimos nessa pandemia que um título de doutor ou um jaleco branco não são sinônimos de ética, caráter, responsabilidade social, dignidade. Muitos médicos e cientistas venderam suas biografias e seus currículos e se uniram a políticos de extrema-direita, líderes religiosos, ex-atletas, pseudojornalistas, todos sem formação científica, para defender uma bandeira política, para defender a farsa do kit covid com ivermectina, cloroquina, azitromicina e outros, defender a ozonioterapia contra COVID-19, para atacar as vacinas, o uso de máscaras, o distanciamento físico e as medidas de lockdown.

 

Combatendo fake news 

O movimento antivacinas continua firme nas redes sociais, mas expandindo para ações ao ar livre, nas ruas e praças. Cada mensagem dos antivacinas se resume basicamente a uma das três narrativas falsas a seguir:  COVID-19 não é perigosa; as vacinas são perigosas; você não pode confiar em cientistas, nem em médicos que seguem a ciência. Mas ataques às vacinas podem não ter nada a ver com as vacinas, como destacado aqui .

 

“Mortes súbitas”

A Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e Esporte (SBMEE) divulgou informe sobre eventos de morte súbita em atletas vacinados contra a COVID-19, mencionando que não há nenhum relato em publicações científicas, ou qualquer comprovação que mostre alguma associação entre morte súbita e vacinas contra o SARS-CoV-2.

Aliás, vários dos nomes listados de atletas que tiveram mal súbito recentemente, e que vêm aparecendo nas listas dos antivacinas como vacinados, não tomaram nem sequer uma dose de vacinas. Mais informações aqui , aqui e aqui.

 

Nem o vírus muda o DNA

Os antivacinas sugerem que as vacinas de RNA mensageiro da Pfizer/BioNTech e da Moderna injetam “DNA alienígena” nas pessoas e vão levar a alterações do DNA dos vacinados. Primeiro, essas vacinas não usam DNA (ácido desoxirribonucleico), mas um pedaço da sequência de RNA (ácido ribonucleico) do vírus para que nossas células possam produzir pedacinhos inofensivos da proteína Spike (S) para ensinar o sistema imune a reconhecer a proteína S do vírus real, caso tenhamos contato com ele no futuro. Esses fragmentos de proteína S são eliminados do organismo após treinar o nosso sistema imune para reconhecer o inimigo e produzir anticorpos neutralizantes e células de memória. Inúmeros estudos mostram que o pedacinho da sequência de RNA mensageiro do SARS-CoV-2 usado nas vacinas não entra no núcleo das células, sendo impossível modificar o DNA e provocar alterações genéticas.

Nem o vírus muda nosso DNA. O vírus SARS-CoV-2 infecta o organismo humano, joga o RNA dele inteiro nas células humanas: escraviza nossas células e se multiplica para produzir milhares ou milhões de cópias dele mesmo, de seu material genético, de seu RNA.

Mas mesmo com esse tanto de vírus e RNA e proteína S de sobra, nem o SARS-CoV-2 consegue mudar o DNA das pessoas.

Outra fake news é que as vacinas de RNA mensageiro são fábricas de proteína S do vírus e vão causar prejuízos à saúde por causa disso. A verdade, no entanto, é que o fragmento de RNA presente na vacina, e que induz à produção de pedaços da proteína S, degrada-se rapidamente e logo para de atuar: ele não se reproduz, como o vírus inteiro faz. As vacinas não produzem o vírus inteiro, apenas um fragmento de proteína S para treinar o sistema imune para reconhecer o vírus real, selvagem. Quando o vírus se replica no organismo, produz milhões de cópias dele mesmo, com mutações, contendo milhões de cópias de RNA e da proteína S.

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Imagine, então, os prejuízos que as milhares ou milhões de cópias do vírus com o seu RNA inteiro e sua proteína S inteira, que são produzidos pela infecção natural, podem causar. Vacinar é muito melhor que correr o risco de ser infectado, e dependemos da vacinação e da manutenção das medidas não farmacológicas para vencer essa pandemia.

 

A narrativa da miocardite

Os defensores das teorias da conspiração também espalham que as vacinas estão causando miocardite em crianças e adolescentes. Os raríssimos casos de miocardite –  12 ocorrências relatadas em 8 milhões de crianças vacinadas nos EUA – foram leves e todos com evolução favorável. As crianças passam bem. Os efeitos adversos mais comuns foram dor no local da injeção, cansaço ou dor de cabeça e febre, que duram de 24h a 48h. Estudos indicam que o risco de miocardite causada pela infecção com o vírus – isto é, por contrair COVID-19 – é várias vezes maior do que o associado à vacina. Um trabalho publicado em dezembro último sugere que o risco trazido pela doença é pelo menos quatro vezes maior do que o ligado à vacina.

Não vacinar nossas crianças não vai protegê-las de miocardite caso sejam infectadas pelo vírus.

A Anvisa e as secretarias de Saúde dos estados realizam acompanhamento e monitoramento da aplicação das vacinas na população e investigam todos os casos de eventos adversos graves relatados. Até o momento, não há mortes com relação de causa e efeito comprovada com a imunização contra COVID-19 em geral, nem com a vacina da Pfizer/BioNTech em particular.

Os vídeos que rolam nas redes sociais trazem pessoas que morreram por diferentes causas, mas que os antivacinas criminosamente relacionam, sem comprovar, com as vacinas. Isso vale para todas as vacinas do calendário infantil. Todos os efeitos adversos relatados no país são comparados com notificações semelhantes no exterior. Mais informações aqui .

 

Vacinas e vidas

Ainda bem que quando nós éramos crianças, não existiam as redes sociais, apesar de já existirem os negacionistas e os antivacinas! Se o movimento antivacina agisse livremente, alguns de nós, crianças na época, não receberíamos as gotinhas da vacina contra a pólio e provavelmente não estaríamos aqui ou estaríamos em cadeiras de rodas, vítimas da paralisia infantil, doença que é controlada graças a vacinas. Apesar de não sabermos o que acontecerá daqui 20 anos com as crianças que tomarem as vacinas, nós sabemos que pelo menos elas não vão morrer de COVID-19 e nem ficarão com sequelas irreversíveis por causa da doença.

 

Riscos, em números 

Mas os negacionistas e os antivacinas vão continuar criando fake news assassinas contra as vacinas para COVID-19. Segundo o site Our World in Data , até o momento, já foram aplicadas 9,56 bilhões de doses de vacinas no mundo (sim, bilhões!!!), sendo que 59,5% da população mundial já recebeu pelo menos uma dose de vacina.

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No Brasil, foram distribuídas 337.931.095 de doses, sendo que 161.775.737 de pessoas (75,84%) tomaram a primeira dose, 144.902.072 de pessoas (67,93%) tomaram a segunda dose ou a dose única e 31.253.286 de pessoas (14,65%) tomaram a dose de reforço, sem efeitos adversos graves relatados.

Resumindo: mais de quatro bilhões de pessoas já receberam pelo menos uma dose de alguma vacina contra o SARS-CoV-2 em todo o mundo – muitas, em países ricos, com alta capacidade de vigilância sanitária e monitoramento de efeitos adversos –, e não há nenhuma morte que tenha sido comprovadamente causada pelos imunizantes. A COVID-19, por sua vez, já matou, comprovadamente, mais de cinco milhões de pessoas, sendo mais de 620 mil só no Brasil.

As infecções pelo SARS-CoV-2 podem matar e, nas pessoas recuperadas, causar sintomas persistentes e "covid longa", deixar sequelas neurológicas, respiratórias e cardiovasculares irreversíveis, além de outras complicações e provocar casos de síndrome inflamatória multissistêmica pediátrica (SIM-P) associada à COVID-19 em crianças.

Então, pergunto: nós temos que ter medo das vacinas que estão salvando bilhões de vidas ou do vírus, que está matando e deixando sequelas irreversíveis em milhões de pessoas?

Seremos cada dia mais bombardeados com fake news assassinas criadas pelo gabinete do ódio e pelo movimento antivacinas, com o objetivo de boicotar a vacinação infantil. Essas mentiras contribuem para menor adesão da população às vacinas, resultando em mais infecções, hospitalizações e mais mortes. Essa onda de desinformação vai nos acompanhar em 2022. Isso tem impacto desastroso.

 

 

Luiz Carlos Dias é Professor Titular do Instituto de Química da Unicamp, membro titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Comendador da Ordem Nacional do Mérito Científico e membro da Força-Tarefa da UNICAMP no combate à COVID-19

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